No dia 24 de agosto de 2023, uma importante mudança foi decretada no cenário jurídico aduaneiro, através da Lei n. 14.651/2023, que redefiniu o tratamento das penalidades relacionadas ao perdimento de mercadorias, veículos e moedas.
O perdimento de mercadorias consiste em uma penalidade imposta pela Receita Federal do Brasil quando ocorrem irregularidades no trâmite desses bens, como contrabando, descaminho, ocultação, fraude, simulação e falsificação de documentos. Nestes casos, o importador perde o direito sob a mercadoria trazida de fora do país.
Até a publicação da nova Lei, o julgamento dessa penalidade era realizado em única instância, sem oportunidade de revisão por outro julgador. Isso significa dizer que uma pena tão severa como o “confisco” do bem pela administração pública era adotado de forma definitiva, sem possibilidade de recurso pelo importador da mercadoria.
Tal fato resultava em questionamentos quanto à compatibilidade do procedimento com princípios basilares do sistema processual brasileiro e garantias constitucionais, como o contraditório e a ampla defesa (artigo 5º, LIV, da Constituição Federal).
A publicação da Lei nº 14.651/2023 foi um marco significativo na abordagem do perdimento no Brasil: a legislação introduziu a possibilidade do duplo grau de jurisdição nos casos de aplicação da pena de perdimento. Esse avanço jurídico se traduz na criação do Centro de Julgamento de Penalidades Aduaneiras (Cejul), composto por auditores-fiscais especializados da Receita Federal do Brasil, responsável pela análise em segunda instância das decisões relacionadas ao perdimento.
Assim, a nova legislação está em sintonia com as normas constitucionais e com as diretrizes internacionais, como o Acordo sobre a Facilitação do Comércio (AFC) da Organização Mundial do Comércio (OMC) e a Convenção de Quioto Revisada (CQR) da Organização Mundial das Alfândegas (OMA).
Em suma, o processo passará a seguir o seguinte procedimento:
- Apresentação da Impugnação:
Após ser notificado da aplicação da penalidade de perdimento, o autuado tem um prazo de 20 (vinte) dias para apresentar a impugnação, contados a partir da data em que ele tiver conhecimento da decisão. A impugnação deve ser uma resposta formal e fundamentada, na qual o autuado pode apresentar argumentos e provas contra a decisão do auditor fiscal.
- Encaminhamento para Julgamento em Primeira Instância:
Uma vez apresentada a impugnação, o processo é encaminhado para julgamento em primeira instância.
- Decisão de Primeira Instância:
Após a análise da impugnação, a autoridade responsável em primeira instância emitirá uma decisão. Caso essa decisão seja desfavorável ao autuado, ele terá o direito de interpor um recurso à segunda instância.
- Recurso à Segunda Instância:
O autuado que discordar da decisão de primeira instância tem um prazo de 20 (vinte) dias para interpor recurso à segunda instância, contado a partir da data em que ele tomar ciência da decisão desfavorável. Esse recurso representa a oportunidade de uma revisão adicional do caso por um órgão superior.
- Decisão de Segunda Instância:
A segunda instância é composta pelo Centro de Julgamento de Penalidades Aduaneiras (Cejul), formado por auditores-fiscais da Receita Federal do Brasil especializados na matéria. Essa instância é responsável por analisar o recurso interposto pelo autuado. A decisão da segunda instância será final e definitiva, a menos que o autuado decida buscar a via judicial para contestar a decisão administrativa.
Vale mencionar que, em muitos casos de aplicação da pena de perdimento, os importadores podem sentir que não há mais ações a serem tomadas. Contudo, é crucial reconhecer a relevância de buscar a orientação de profissionais jurídicos especializados, uma vez que podem revelar alternativas e estratégias legais que resultem na reversão ou mitigação das penalidades.
A Kistenmacher Advogados está à disposição para auxiliar o importador em todas as etapas desse processo. Com uma equipe experiente e dedicada, oferecemos suporte jurídico especializado para enfrentar os desafios e aproveitar as oportunidades da nova legislação.
Shirlene Reichert